quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Um homem merece ser mais do que um número na terra...

Não sou poeta, não sou escritor, não sou um homem das letras, gosto de dizer o que penso e pensar o que digo. E é neste processo que me é involuntário e inintencional que dou por mim a dizer coisas cujo valor é inflacionado pelas pessoas que me rodeiam, colocam-me no meio de nomes conhecidos da escrita que não vou nem mencionar para não os desrespeitar, dão-me valor pelas palavras quando são palavras que poderiam ser ditas por qualquer outra pessoa.

Como puderam ver no meu post anterior, faleceu um amigo meu há uns dias atrás, a situação não poderia ter sido mais constrangedora. Desde o choque de sabermos desse facto até ao tentar encontrar motivos pelos quais as coisas acontecem da maneira que acontecem, foram ditas imensas coisas, especulou-se...muitos que não conheciam bem o homem por trás do rosto calmo e muitas das vezes sério próprio da profissão, não se contiveram e inventaram teorias e mais teorias para se calhar encontrarem um resquício de lógica em toda a situação para que pudessem enquadrar uma morte precoce nas suas vidas enfadonhas e lineares.

Não espero uma resposta linear...

Aceito as experiências, os sorrisos, as situações por que passámos e deixo o meu coração absorver esses momentos como coisas boas que a vida nos proporciona. Aceito ainda a sua morte como um aspecto simples do ciclo da vida. Nasce-se, vive-se e morre-se. Não interessa quanto tempo demoras a fazer cada um. Existem bebés prematuros, é porque estão ansiosos por nascer? Existem pessoas que morrem de doença prolongada, é porque não querem morrer? Não vou então dizer que morrer na casa dos 30 seja normal mas vou ser forçado a admitir o chavão "não é o quanto vives mas sim a intensidade de como vives a vida".

Porém há certos aspectos no que diz respeito a uma transição final que não me agradaram. A maior parte relacionadas com o acto do enterro.
Morrer no inverno se calhar só piora esta minha impressão e aversão à experiência. À chegada ao lote da campa a terra encontrava-se lamacenta, de lado na rua do cemitério junto onde nos encontrava-mos estavam várias coroas e ramos de flores arredados, já murchos, durante as palavras de um padre que aparentava não ser português e que tinha alguma dificuldade em ler pausadamente os escritos religiosos, um corvo grasna ensurdecedoramente, tornando o momento mais sombrio, rapidamente esquecemos tudo isso sob a possibilidade de um último adeus ao nosso amigo.
Os seus companheiros Rangers fizeram uma última homenagem de despedida e não contiveram os gritos bem altos das suas gargantas num momento que me arrepiou profundamente e me fez soltar mais umas lágrimas.
O caixão voltou a ser coberto e encaminhado para o seu destino final. O silêncio ensurdecedor das lágrimas e da falta de vontade de querer falar ecoava na minha cabeça mas foi interrompido pelo som seco e áspero das inchadas na terra, desta última a cair por cima do caixão. Ao colocarem as coroas e ramos por cima da campa, colocaram também o numero que a identificará para futuras visitas, foi neste momento, que nada mais me passava pela cabeça que a enorme revolta de este ser o nosso último destino...fechados numa caixa...debaixo da terra...com um número por cima...

Soltei um desabafo...

"Um homem merece ser mais do que um número na terra..."

Quando confrontado então mais tarde com o facto de dizer coisas bonitas respondi apenas:



"Abdicava das coisas todas que digo e que são consideradas bonitas para ter de volta a companhia dos que amo e já morreram"

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